sexta-feira, 19 de julho de 2013


TEM DIAS

Tem dias em que o acordar é translúcido e toldado de memórias doentias.

O lençol da deceção está tão porco que nem as lágrimas suadas lhe tiram as nódoas.

Um cansaço vespertino que ferve à procura de pontos de luz para onde a atenção possa ser desviada.

Incrédulos os pedaços da pele a tentarem voltar a aconchegar-se na própria identidade.

Alma retorta na repugnância invasora que impregna o corpo, como se entrasse pelos poros e se alojasse em todo o cérebro, depois de sujar cada pedaço de pelo, de musculo e de osso.

Não há banho de lixívia remova este nojo.  

As astúcias dum satanás brincam com fantasmas desenterrados à força e cultivam sombras, dando colo a medos pestilentos que farejam a náusea.

Uma desconcertante rede que pesca as agruras e solta angústia para ser caçada num anzol.

Só a raiva, mesmo quando presa na impotência, espicaça uma revolta, que serve de alavanca para a coragem num moldar do pensamento.

Mola de atitude contra o negrume, na ativação de sonhos renovados que já não querem voltar para a cama antes da noite.

Sim, porque também há dias em que os pesadelos do dia são tão mais absurdos e medonhos que criam uma vontade de sono compulsivo, único assassino dos terrores da vida real.
texto de Mirandulina

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